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O intercâmbio dos outros

Posted on quarta-feira, julho 22, 2015

Mimos da China!
Saí do trabalho. Peguei o trem. Estava ansiosa. Não por ir à Polícia Federal, renovar passaporte. Por reencontrar uma amiga que não via há dez meses.
Ela fazia intercâmbio na China, lá do outro lado do mundo. Outra cultura, outros costumes, outra língua... Deve ser estranho passar tanto tempo em um lugar tão diferente. Mas eu só posso conhecer o meu lado, o lado dos que ficam.
Sempre vejo pessoas escrevendo seus diários de viagem, blogs sobre intercâmbio etc. Mas acho que nunca vi ninguém falando sobre quem fica. Até porque somos meros coadjuvantes nessa história. Mas são muitos mais os que ficam, do que os que vão.

Quem será que sente mais saudades: quem viaja ou quem fica? Eu não sei responder essa pergunta. Eu diria que quem fica, porque a pessoa que vai vê muitas coisas novas, diferentes do cotidiano. Há quem diga que é quem viaja, porque está distante de todos que convive, justamente desse cotidiano que nos prende aqui.
Saudade é uma coisa engraçada para quem fica, também. Tenho mais uma amiga fazendo intercâmbio atualmente, na Alemanha. Toda vez que, nesses últimos meses, pensei em falar com elas, tentei me frear um pouco. Sinto como se estivesse me intrometendo nas experiências delas por falar demais. O contato muito frequente com o país natal pode prejudicar a absorção do idioma e cultura locais. Mas até que ponto isso é saudável? Quando você deixa de ser uma amiga preocupada e passa a ser a chata que não fala mais com a amiga distante?
Algo legal, por outro lado, é o fato de em cada conversa haver tanta coisa para contar! Quem fica tem tanto para aprender com quem foi... Quem foi tem tanto para saber sobre quem ficou.
E quando o intercâmbio dos outros termina, você apaga toda a distância e o tempo longe com um abraço. Não há nada como reencontrar um amigo.

A foto acima é dos chás chineses que ela trouxe para mim, Jan e minha mãe! Eles tem um cheiro maravilhoso e a promessa é que o da direita tenha gosto de pão (?). Obrigada

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Conversas de corredor: Violência doméstica

Posted on quinta-feira, maio 21, 2015

Image from page 285 of "American homes and gardens" (1905)
Imagem disponível aqui
Faz um tempo já, considerando que sempre tento escrever o post e apenas algumas palavras são extraídas cada vez. Mas continua sendo algo que eu tenho vontade de contar, de publicar.
Antes de começar, tenho a obrigação de informar que este texto não pretende ser científico. Não há citação, não li diversos autores nem estudei ideologias ou filosofias para escrevê-lo. Portanto, ele tem um conteúdo muito mais de relato de alguém que passou por algumas situações inusitadas para si, mas muito comuns de se ver no dia-a-dia forense. Contém, assim, uma perspectiva, apenas.
No dia 18 de março, fui a um Fórum na região metropolitana de Porto Alegre, para acompanhar uma audiência na Vara Criminal que cuida dos casos de violência doméstica. Repare: há uma vara específica para tratar questões deste tipo - o que significa que há um volume enorme de processos desse gênero por lá.
A intenção era acompanhar uma audiência em que seria julgado o sujeito que estuprou a própria filha. Tive a oportunidade de ler o boletim de ocorrência lavrado na data da prisão dele - e foi impossível conter o nojo. A moça veio de um local distante para conhecê-lo e foi recebida com uma casa de abertura única, que ficava trancada com ela dentro - ela teve o contato com os demais familiares cortado e foi abusada diversas vezes, repito, pelo próprio pai (que encontrou via internet, mas não vou nem entrar no mérito dos perigos de encontrar pessoas via mundo virtual). Engravidou do próprio pai! Diversas outras coisas estão envolvidas na história, mas o ponto não é esse e me sinto mal expondo essa situação, mesmo que sem identificar absolutamente ninguém.
Por fim, não pude assistir essa audiência. Ela não aconteceu. Motivo: a SUSEPE (responsável pelo transporte dos presos) não conseguiu trazer esse "pai" para a audiência em tempo. Também não vou entrar nesse mérito.
Porém, até saber que não haveria audiência, passei boas três horas sentada no corredor. Você já esteve no corredor de um Fórum, sobretudo no ambiente das varas criminais? Eu nunca havia estado.
Há um clima muito estranho por lá. Vítimas e suspeitos/acusados/criminosos/pessoas envolvidas no processo criminal estão basicamente no mesmo local. Vários presos chegam algemados e escoltados por senhores que portam armas volumosas e assustadoras. O olhar na face daqueles que vêm acompanhados é indescritível.
Eis que ouvi muitas coisas naquele corredor. De algumas conversas eu participei, outras, apenas ouvi, recolhida em minha insignificância.
Uma mulher (a vítima) que estava em audiência assim que cheguei saiu da sala, ao final da sessão, chorando. Seu ex-companheiro havia sido condenado. "Ainda bem que agora esse desgraçado fica preso! Por mim podia morrer na cadeia. Da última vez que ele me bateu ele quase me matou." Ela ainda tinha marcas. A mulher que acompanhava ela (a mãe, acredito) completava suas frases, confortava e comemorava essa "vitória".
Outra mulher, que estava sentada ao meu lado durante boa parte da tarde, puxou assunto comigo. "Vamos ver se vai sair a minha audiência. Não aguento mais esperar" e pediu que eu cuidasse se a chamavam - pois ela ia fumar um cigarro (ok, ela estava nervosa). Quando voltou, ela disse que queria que essa audiência terminasse logo. Foi casada 19 anos, separou-se e encontrou um cara novo. Namorou com ele por um tempo e ele começou a bater nela. "E o meu marido anterior era um amor... Só não deu mais certo, com esse que é o pai da minha filha. Aí fui achar sarna pra me coçar. Esse cara bateu em mim e da última vez só não me matou porque, não sei como, meu gato pulou nele e fez ele parar. Se não ele tinha me matado".
Eu ficava abobada com os casos que ia ouvindo. Sabe quando você não tem resposta? Eu me sentia assim. Nada que eu quisesse dizer ia poder consolar aquelas mulheres tão feridas, não só em corpo, mas também em alma. Mais abobada eu fiquei quando ouvi a conversa do segurança do corredor.
Um sujeito (que acredito ser um réu que estava ali para estar em audiência) puxou conversa com esse segurança (que não sei se é bem um segurança). O que diziam? "Bah, essa maria da penha... Hoje em dia tu encosta em alguém e já é motivo pra ir pra cadeia. Em vez de irem pegar bandido mesmo...".
Eu poderia escrever uma tese sobre isso. Sobre essa frase, pronunciada no local mais impróprio, com a mentalidade mais miúda. Qual será que é a definição de "bandido mesmo"? Será que apenas quando toca o patrimônio de homens brancos de classe média/alta o negócio deve ser punido com correções severas?
Aí eu poderia discorrer muito mais sobre a hipocrisia que percorre os discursos que rodeiam a sociedade atual - por meio do Direito, da mídia, das conversas de bar e o que você quiser imaginar. Mas deixo que você pense e, talvez, me fale o que acha disso tudo. O que me chamou a atenção foi esse ambiente, essas conversas e essas histórias.

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Andanças #1

Posted on sábado, fevereiro 01, 2014

#1 porque muitas hão de vir e espero escrever sobre


Já faz um mês que estou no Rio de Janeiro. Surpreendente, parece que cheguei ontem. Quero colocar umas fotos, mas eu não as tenho em mãos agora, talvez depois.Tá, coloquei duas fotos. Nem sempre tenho fotos, pois estou sozinho e as vezes saio sem máquina.
Não escrevi antes porque não tenho ~tempo livre~ vocês vão entender.

A primeira, longa, noite:

Saí de Porto alegre dia 31/12, ano passado. Chegando no Rio eram passadas as 19h, já não sei dizer exatamente porque faz um mês. Peguei um ônibus no aeroporto Galeão (o Rio tem 2 aeroportos, o Galeão é mais longe do centro), me disseram que ele ia passar no Jardim Botânico, meu destino, aluguei uma casa lá. Porém o dia 31/12 é um dia muito especial. Em especial no Rio, onde todo mundo vai pra Copacabana ver os fogos, junta cerca de dois milhões de pessoas! Quase todo mundo estava indo para lá, então no caminho conseguiu-se chegar o mais perto possível da praia. Então quando eu percebi que tínhamos passado do caminho para o Jd Botânico eu perguntei pro motorista ele me disse que no meio do caminho descobriram que dava pra chegar mais perto da praia. Pedi pra ele me largar ali perto do metrô, porque em estações é mais fácil de se achar. A gente já estava lá na Cantagalo! Consegui ainda pegar o metrô, era umas 8 e pouca, quase nove. Fui até a Botafogo e ali descobri que nem os ônibus do metrô (eles chamam de metrô na superficie) nem os ônibus normais estavam funcionando. É, o dia 31 é meio catastrófico, a sensação era de estar numa espécie de apocalipse, eu via multidões caminhando na mesma direção, a maioria de branco.


Nesse ponto eu aceitei a hipótese de pegar um táxi.
Ataquei um taxi na rua que me perguntou pra onde eu ia, quando eu disse Jd Botânico ele aceitou me levar. Conversamos, ele me disse que já estava prestes a ir pra casa tomar uma cervejinha porque afinal ele também é gente. Dentro do carro eu considerava a hipótese de ir também ver os fogos, um grande evento que eu não sabia quando teria a chance de ver. Falei perguntei quanto que ia custar me levar de onde eu estava até o mais perto da praia, ele disse que uns 15 reais. "Vou ver os fogos!", o taxista me esperou sem dar outra bandeirada. Eu fui pro ap o mais rápido que pude, consegui obter as chaves, larguei minhas coisas e fui. O cara me deixou num lugar ali depois me explicou exatamente como fazia pra voltar. Tranquilo. Segui a multidão e assisti aos fogos. Voltei a pé e dormi já tarde, eram umas 2h.

A meia dúzia de dias seguintes andei bastante. Fui à praia, conheci o centro (um pouco, já era tarde quando cheguei lá), vi de longe os arcos da lapa, conheci o Botafogo (bairro), a feira de São Cristóvão, o Theatro, o Caixa Cultural. Mas por hora relato o primeiro momento, em breve posso continuar.


Depois começou o motivo de eu estar aqui, estou fazendo um curso de verão no IMPA. Tem que estudar bastante e não é brincadeira :). É de Álgebra Linear, ganhei bolsa e não vou explicar exatamente agora do que trata. Curso ~exatas~ e sou bolsista do CNPQ em matemática. Enfim, isso é só um esclarecimento, não é o objetivo do post.


Kutabare! ~ :D